A diferença que existe entre estados e municípios quanto ao recolhimento de determinados impostos ou contribuições não é algo recente. Durante muitos anos, as empresas de alguns segmentos convivem com esse tipo de questão e têm dificuldades em saber a qual dos órgãos tributantes é devido o imposto sobre a comercialização de determinados itens.
Com o surgimento de novas modalidades de comercialização e oferta de diversos produtos em ambiente digital, acabam surgindo novos pontos que geram esse tipo de discrepância entre esses entes. A bola da vez, nesse sentido, é a tributação de bens digitais.
Neste artigo, vamos mostrar para você como funciona esse processo, o que a legislação tem a dizer sobre o assunto, bem como, a forma correta de se aplicar a Lei nestes casos. Acompanhe!
O crescimento na oferta de produtos digitais e o impacto na tributação
Atualmente, estamos presenciando a criação de inúmeras tecnologias e processos inovadores que desafiam diretamente os conceitos e procedimentos previstos na antiga legislação tributária brasileira. A atual norma prevê uma situação específica que gerará a incidência de tributo, o qual conhecemos como “fato gerador da obrigação tributária”.
E é exatamente nesse ponto que a veloz evolução da tecnologia altera consideravelmente a noção de produtos e serviços, bem como, as hipóteses que geram o nascimento das obrigações tributárias a que os contribuintes e o fisco estão submetidos.
Nesse cenário de frequentes inovações e alterações, a tributação dos bens e produtos que são considerados como digitais acaba gerando certa disputa entre os entes federativos, principalmente, estados e municípios o que também, por vezes, acarreta em ônus excessivo para o contribuinte que, em determinados casos, se vê na obrigatoriedade de contribuir com os respectivos impostos de ambos os órgãos de tributação.
A legislação da tributação de bens digitais
Antes de adentrarmos na esfera jurídica e tributária, é importante entender o conceito de bem digital perante os órgãos de tributação. Basicamente, eles são todo e qualquer software, livros digitais, fotos, área de membros, entre outros, que são armazenados em meios digitais, utilizando a tecnologia de bytes, podendo ser acessado por meio de diversas ferramentas, tais como: computadores, tablets e celulares.
Os softwares são o centro da discussão entre estados e municípios e o que faz emergir a disputa que estamos destacando neste artigo. Isso porque, nem sempre é fácil distinguir se esse elemento se trata de um produto ou serviço.
Assim, buscando um alinhamento tributário quanto à competência de cada um — da forma que é instituída no artigo 155, II e o 156 da Constituição Federal — observamos que os bens digitais podem ser tributados de duas formas, pelo ICMS, imposto de competência estadual, bem como, o ISSQN, de responsabilidade municipal.
Porém, a legislação estabelece a aplicação de um ou outro imposto, não sendo possível a cobrança cumulativa de ambos, sendo que, uma vez definida a incidência do ICMS, não há que se mencionar em hipótese de incidência do ISSQN. Quando isso ocorre, temos a incidência de um termo jurídico que pressupõe duas penalidades sobre o mesmo fato gerador, o “bis in idem”.
Além da legislação mencionada, também existem outras decisões e posicionamentos proferidos pelas cortes judiciais brasileiras. Elas já foram provocadas a emitir um posicionamento sobre o assunto e pacificar o tema de uma vez por todas.
Entre as decisões que já foram proferidas, temos o exemplo da Recurso Extraordinário 176626/SP, em que o Supremo Tribunal Federal manifestou entendimento que os softwares são elementos produzidos em cópias e distribuídos em série, sendo assim, poderiam ser classificados como mercadorias, sendo a competência tributária dos estados e o pagamento de tributos do ICMS.
No entanto, também estabeleceu que os softwares produzidos exclusivamente para um cliente em específico, devem ser classificados como um serviço, sendo a competência tributária do município, podendo, assim, exigir a cobrança do ISSQN.
Além disso, o Convênio ICMS 106/17 publicado pela Receita Federal, determinou que jogos eletrônicos, arquivos digitais e aplicativos, todos padronizados e que possam ser comercializados por meio de download, também são de responsabilidade dos estados, ou seja, aplica-se a tributação do ICMS.
Tratando-se dos municípios, a Lei Complementar 157/2016 definiu que quando determinado bem digital é disponibilizado sem cessão definitiva de conteúdos por meio da internet, será considerado como um serviço passível de aplicação das alíquotas de ISSQN. Entretanto, vale ressaltar que ainda assim, existirá a imunidade tributária para os casos de jornais, periódicos e livros.
A diferença entre estados e municípios
Como podemos perceber, a legislação acessória e o entendimento dos órgãos máximos da justiça brasileira ainda não apresentam uma solução definitiva para todos as discrepâncias que surgiram e que ainda aparecerão entre estados e municípios, no que se refere à tributação de bens digitais.
Assim, atualmente, aplica-se a tributação de acordo com o tipo do bem digital e a sua classificação. Por exemplo, se ele se aproxima mais do conceito de mercadorias, o fato gerador será o ICMS, ao passo que o mesmo processo se aplica aos que têm mais relação com a tributação do ISS.
Dessa forma, enquanto não há uma definição concreta sobre todos os tipos de bens digitais e as respectivas tributações, as empresas utilizam desse recurso para manter sua arrecadação tributária em dia, sem prejudicar sua saúde financeira, bem como, não deixar de pagar seus impostos.
Há quem acredite que a diferença entre estados e municípios nunca haverá solução, principalmente, pelo fato de a cada ano surgirem novas ferramentas e tecnologias que fomentem ainda mais a discussão. No entanto, espera-se que apareça uma solução mais adequada, investindo na unificação dos tributos, como ocorre nos países da União Europeia em que o mesmo fato gerador gera obrigações de natureza de mercadorias e serviços.
Entretanto, para que isso ocorra em nosso país, seria necessário um Projeto de Emenda à Constituição (PEC), percorrendo todo o longo, custoso e demorado caminho até a aprovação do poder executivo e, seguidamente, entrada em vigor.
Como você pode perceber, estados e municípios ainda não têm uma posição definida e específica sobre a tributação de bens digitais. Neste contexto, cabe ao contribuinte conhecer bem o que determina a Lei e aplicar ela de forma estrita para evitar problemas futuros com alguns dos órgãos tributantes.
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